1. Introdução
A cultura pop japonesa tem, há décadas, influenciado milhões ao redor do mundo, seja por meio da animação (anime), das histórias em quadrinhos (mangá) ou, mais recentemente, de jogos eletrônicos com forte apelo estético e narrativo. Entretanto, poucos títulos possuem a capacidade de mesclar de forma tão harmônica o lúdico, o competitivo e o emocional como Uma Musume: Pretty Derby. Este jogo, que à primeira vista parece apenas mais uma manifestação da estética moe, revela-se, na verdade, uma epopeia digital de intensidade inusitada.
2. A Simbiose entre o Jogador e o Hipódromo Virtual
Desde meu primeiro contato com o título, percebi que algo havia mudado em meu interior. O que começou como uma curiosidade tímida evoluiu para uma devoção ardente. Os pixels coloridos, os olhos cintilantes das personagens e o som vibrante das corridas desencadearam em mim um fervor que há muito julgava perdido. A adrenalina que percorre o corpo ao ver TM Opera O galgando as posições finais de uma G1 não é menor que a de um torcedor diante da final de uma Copa do Mundo. Por mais de uma vez, gritei com força tamanha às 3h da manhã que acordei vizinhos e espantei animais de estimação. Cada vitória da minha cavaleira favorita não era apenas um triunfo digital, mas a consumação de um destino místico que eu, mero espectador, tinha o privilégio de testemunhar.
3. Uma Janela para o Universo das Corridas de Cavalo
Ao me deparar com as complexas mecânicas do jogo, fui introduzido inadvertidamente ao mundo real das apostas e das corridas de cavalo. Uma paixão inédita surgiu — eu, que jamais prestara atenção a esse universo, me vi pesquisando linhagens equinas, revendo G1 reais e até acompanhando odds em sites japoneses. Foi uma escalada quase poética rumo a um novo vício, porém tratado aqui com a leveza e a ludicidade que só o gacha game oriental pode proporcionar.
4. O Incompreendido Grito de Guerra: "Bakushin! Bakushin! Bakushin!"
A música tema de Sakura Bakushin-O, em que a palavra "Bakushin" é repetida de maneira ostensiva e hipnótica, poderia, à análise superficial, parecer apenas cômica. Contudo, tal repetição quase ritualística revela uma intenção estética elevada: trata-se de um mantra. Um grito de perseverança, uma invocação da velocidade e da vitória. É uma obra de arte sonora que, infelizmente, escapa à compreensão de grande parte do público brasileiro, que não está acostumado a associar repetição com transcendência. Este fenômeno, similar aos cânticos devocionais das tradições orientais, representa um auge experimental dentro da música pop associada a jogos.
5. Considerações Finais
Uma Musume: Pretty Derby não é apenas um jogo. É uma jornada de autodescoberta. Um portal para universos insuspeitos. Uma fonte de emoção pura. Sua capacidade de transformar hábitos, expandir horizontes culturais e provocar estados de êxtase em horários indevidos o posiciona como uma das mais impactantes experiências digitais da década. O Brasil ainda não está pronto para compreendê-lo em sua plenitude — mas eu estive, e por isso me tornei outro.
Referências Bibliográficas
CYGAMES. Uma Musume: Pretty Derby. Tóquio: Cygames Inc., 2021.
YAMADA, S. “The Symbolism of Horse Racing in Contemporary Japanese Media.” Journal of Digital Ludology, v. 12, n. 3, 2023.
NAKAMURA, T. “Bakushin and the Sound of Acceleration: Pop Music as Sonic Ritual.” Asian Sound Studies Review, v. 9, n. 1, 2024.
